24 agosto 2005

Ainda há optimistas...

Os investidores voltam a estar confiantes e, ficámos ontem a saber, o índice que mede este ambiente empresarial está no melhor nível dos últimos 17 meses. Não admira que o optimismo volte a espreitar. Apesar do longo período de estagnação económica, as empresas estão mais rentáveis porque cortaram custos, valorizam-se na bolsa, exportam mais.
A perspectiva de bons negócios já se pressentia em certos indicadores parcelares: as despesas das empresas em novas máquinas industriais; o desemprego em queda.
A reestruturação das empresas não teria sido possível sem a compreensão dos sindicatos. Obviamente. E os sindicatos estão a abandonar a atitude de permanente obstáculo às mudanças. Entenderam, por fim, que estavam condenados se não fossem eles o agente dessa mudança.
Perceberam que os trabalhadores eram, mais que todos, vítimas do persistente definhamento do país, que dura há quase uma década. E da consequente perda de competitividade, que as empresas sentiam a cada dia que passa.
As pessoas, estatisticamente identificadas como «consumidoras», não demonstram tanto entusiasmo, porque ainda receiam perder o emprego. Não é certo que já tenha sido ultrapassado o maior impacto da deslocalização para o Leste, para a China e outros países asiáticos.
Mais fábricas podem fechar. Mas, ainda assim, as sondagens têm-se tornado cada vez mais favoráveis ao Governo socialista. E, subitamente, contra todas as expectativas, o primeiro-ministro pode vencer as eleições legislativas de dia 18.
Legislativas? A 18 de Setembro? Num clima de negócios mais favorável? Com a maioria dos cidadãos a compreender as medidas do Governo? E, mais que isso, disposta a renovar por quatro anos a maioria parlamentar que o apoia?
Não, não é ficção. Infelizmente também não é Portugal. É a Alemanha. Sim, a Alemanha que, como Portugal, tem apresentado um dinamismo económico pior que toda a União.
A Alemanha que, continuando a ser maior economia europeia, havia entrado num processo de divergência tão profundo que, na UE a 15, o nível de rendimento da sua população já estava aquém da média 100.
A boa notícia é que a Alemanha parece despertar. A sociedade quer reagir. Aceita flexibilizar as regras. Liberta-se das corporações dementes. Isso é bom para toda a Europa. Acabará por ser bom para Portugal. Difícil é perceber como.
Os investidores estão menos confiantes. Os consumidores nem se fala. Mas surgem sintomas de animação numa economia estagnada.
O IVA, por exemplo, mesmo antes do aumento da taxa, vê as receitas crescer a ritmos impressionantes. Não é a economia, é o petróleo. Ou seja, não é sintoma mas ilusão. A Galp transformou-se numa gigantesca repartição de finanças.
Os sindicatos não inspiram confiança. Os governos têm difundido a desconfiança. Não há elites inocentes nesta tragédia, em que os incêndios se tornaram a pior metáfora do estado da nação.
As leis por cumprir. Os criminosos por punir. Impunidade que rima com incapacidade. A culpa que não é de ninguém, as instituições que não respondem.
Até os alemães estão a arrumar a casa. Os portugueses, desamparados, impotentes, têm as suas a arder.

Sérgio Figueiredo in Jornal de Negócios - 24/08/2005

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